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Princípio 3 – Deve haver a máxima utilização das potencialidades físicas, intelectuais e espirituais do indivíduo e do coletivo

Enquanto o segundo princípio identifica a gama de recursos que existem e defende a sua máxima utilização e a sua distribuição racional. Mas só os seres humanos podem utilizá-los para produzir objetos ou criar serviços úteis. Assim o terceiro princípio defende que devemos utilizar ao máximo o potencial humano, quer a nível individual, quer a nível coletivo. Neste princípio está implícito uma inter-relação, em que indivíduos saudáveis criam um coletivo são e vice-versa.

Historicamente temos regimes políticos que beneficiaram a ideia de um coletivo em detrimento do atendimento das necessidades mínimas individuais, vários países comunistas são exemplo. Por outro lado, há casos de interesses individuais a suplantar o coletivo, abrindo caminho para que um pequeno grupo de privilegiados tenha uma vida muito acima da média da sociedade. Nenhuma destas situações deve ser encorajada, pois o potencial humano terá muita dificuldade em expressar-se nestes contextos.

O desenvolvimento do potencial máximo dos indivíduos requer uma boa educação, oportunidades concretas para a aplicação dos conhecimentos adquiridos e uma base económica adequada. Infelizmente muitas países veem a educação como um custo e não como investimento, defendendo cortes orçamentais para conter défices e aplicando políticas de cortes fiscais para os mais ricos, para que possam fazer os investimentos na economia. Só com trabalhadores educados a economia poderá ser mais produtiva e criar assim mais prosperidade.

Este princípio fala em maximizar o potencial físico, intelectual e espiritual, como fazer? Nesta época tecnológica um conjunto de equipamentos existem que permitem potenciar a força física, como tratores, caminhões, etc. A nível intelectual o investimento na educação é essencial para que o conhecimento seja depois aplicado para benefício da sociedade. O desenvolvimento espiritual é conseguido quando atingimos níveis de paz interior, um estado de quietude para além dos pensamentos e das emoções.

A cooperação entre indivíduos e as suas Instituições permite sermos mais eficientes nas tarefas a desempenhar. Resumindo, o desenvolvimento dos potenciais individuais e coletivos é um ingrediente primordial para o funcionamento do segundo princípio e criar sociedades em que os recursos possam ser utilizados para o benefício de todos.

Recordamos que estes princípios irão guiar a seleção de políticas para alcançar um mundo melhor, de acordo com a visão Neo humanista. Em artigos futuros iremos também analisar porque Portugal falhou em criar uma sociedade desenvolvida e o que podemos fazer hoje para mudar. Estes princípios guiarão essa análise bem como a seleção de políticas neste contexto histórico para o caso português.

Francisco Dinis – Membro da equipa do Prout Research Institute de Portugal

(ilustração: @sarar.pela.arte)

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2º Princípio de Prout – Deve haver a máxima utilização e distribuição racional dos recursos materiais, intelectuais e espirituais

Este artigo foi construído com extratos de textos do livro “Despertar para uma Nova Economia”, de Roar Bjonnes e Caroline Hargreaves.

            Limitar a acumulação de riqueza é vital para garantir a todos os indivíduos as condições mínimas de vida. Contudo, a menos que que se crie riqueza suficiente para satisfazer as necessidades de todos, a  limitação da acumulação não é suficiente. O segundo Principio aborda esta questão. Primeiro advoga a necessidade da máxima utilização dos recursos e depois afirma que estes recursos devem ser distribuídos racionalmente.

            Que tipo de recursos existem?

            1º – Materiais, incluem terra, água, minerais, energia, entre outros dentro da categorias recursos materiais naturais. Também são incluídos os recursos materiais que foram transformados pela atividade humana como fábricas, quintas, carros, navios, etc. O segundo Principio declara que todos devem ser utilizados ao máximo, o que significa que por exemplo os minerais devem ser extraídos eficientemente e transformados em artigos úteis com o mínimo de desperdício; que a capacidade produtiva não deverão ser mantidas ociosas. Durante a utilização dos recursos, deve ser utilizada a mais recente tecnologia apropriada.

            2º – Recursos intelectuais ou imateriais são ideias, conhecimentos e know how. Também incluem todas as expressões artísticas. Na realidade a própria mente humana é um recurso imaterial. Sem recursos intelectuais é impossível utilizar os recursos materiais, já que o próprio processo de utilização é um conceito intelectual. Os recursos intelectuais são diferentes dos materiais na medida que não diminuem quando são utilizados. Quanto mais os recursos intelectuais são distribuídos, mais valor mais valor eles produzem. Quando mais educada for uma sociedade, maior será o seu potencial de prosperidade social, cultural e económica.

            3º – Recursos espirituais. Todas as culturas e religiões reconhecem uma realidade além do mundo material, que é fonte de força, inspiração e ânimo para os indivíduos. Os recursos espirituais incluem escritos edificantes, educação ética, práticas espirituais de vários tipos, contacto e momentos de aprendizagem com pessoas conectadas com essa realidade transcendental. Algumas personagens místicas históricas que contribuíram espiritualmente e culturalmente, como o Rumi, no Irão e Santa Teresa de Ávila, na Península Ibérica.

            A máxima utilização está relacionada com a distribuição racional. É impossível utilizar ao máximo alguma coisa se ela não for devidamente distribuída. A distribuição racional significa:

            a) Reservar recursos suficientes para a produção futura;

            b) Fornecer a todos os seres humanos os requisitos mínimos, produzindo quantidades suficientes de bens de primeira necessidade a preços acessíveis.

            c) Proporcionar regalias especiais às pessoas que contribuem muito para a sociedade.

            A utilização máxima está também relacionada com o conceito de utilização eficiente. Se algo for utilizado de forma ineficiente, haverá desperdício e ficamos aquém da utilização máxima.

            As ineficiências da economia atual são enormes. Por exemplo, a maioria dos investidores prefere especular do que realizar investimentos produtivos, assim são desviados para a especulação 95% de todos os investimentos. A especulação não acrescenta qualquer valor nem produz nada. É uma economia parasitária que se alimenta da economia real e produtiva. Assim, 95% de todos os investimentos que deveriam ser fonte de carecimento económico são completamente desperdiçados.

            A pobreza não só priva as pessoas de necessidades materiais como também as impede de desenvolver as suas próprias potencialidades. Sem educação e saúde apropriadas, as pessoas tornam-se em fardos em vez de recursos. Se todos os seres humanos tivessem acesso à educação, à saúde, à alimentação e a outros recursos para desenvolver os seus potenciais inatos, seriam capazes de contribuir imensamente para a sociedade e assim aumentar a riqueza coletiva além do que consomem. Manter a maioria na pobreza, enquanto que uma minoria vive no luxo é um falhanço moral e um desperdício.

            Com estas noções sobre os recursos, estamos prontos para aceder ao terceiro Principio, que está relacionado com o potencial dos seres humanos, que de facto conjugam todas as categorias de recursos disponíveis para a produção de coisas com valor para a sociedade, falaremos dele no próximo artigo.

Francisco Dinis – Membro da equipa do Prout Research Institute de Portugal

Shanti Agostinho2º Princípio de Prout – Deve haver a máxima utilização e distribuição racional dos recursos materiais, intelectuais e espirituais
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1º Princípio de Prout – Não deve ser permitida a acumulação de riqueza, sem a permissão da sociedade

Relembrar que estes Princípios são orientações, que guiam políticas, para alcançar uma sociedade de abundância para todos. E se é esse o nosso objetivo, o crescimento da riqueza individual ilimitada é um obstáculo a isso. Uma parte das pessoas foge da análise desta ideia instintivamente porque vivem na fantasia de que devido à sua inteligência e esforço poderão ser um dia um Bill Gates, um Steve Jobs, etc, com alguns a justificar que com esse dinheiro “vão fazer coisas boas para todos”. Tudo muito bem quando falamos de escalas pequenas, no entanto, a acumulação exagerada de riqueza nas mãos de alguns afeta negativamente o próprio crescimento da economia real e outras consequências não positivas para a sociedade, a apresentar neste texto. A acumulação de riqueza sim, mas num modelo de descentralização e de democracia económica, como o apresentado por Prout. 

Quando falamos de limitação de riqueza individual, há dois aspetos a ter em consideração. Um é estabelecer um limite ao rendimento; o outro é estabelecer um teto à quantidade de riqueza que uma pessoa pode acumular. Quando consideramos limites máximos ao rendimento, devemos também observar duas categorias: o rendimento do trabalho e aquele que é obtido por ser titular do capital. O primeiro princípio engloba todas estas formas de riqueza. 

Para deixar claro sobre a diferença entre riqueza e rendimento, podemos dizer que a primeira são ativos materiais (casas, carros, fábricas, etc) que uma pessoa, agregado familiar ou instituição possui. O rendimento é o montante total do valor monetário ganho durante um determinado período, um fluxo monetário. 

Thomas Picketty no seu livro “Capital in the 21st Century” tenta responder à questão, se a estrutura do capitalismo elimina a desigualdade económica ou a reforça? Existe uma crença entre os economistas em que o capitalismo reduziria a desigualdade, entre os ricos e os pobres, no longo prazo. 

Na ciência económica a hipótese das curvas de Kuznets sugere que a desigualdade cresce quando os países iniciam processos de industrialização, mas depois cai. Piketty discorda, dizendo que o capitalismo cria mais disparidade económica. Estas diferentes conclusões podem ser justificadas pelas épocas dos dados analisados, as curvas de Kuznets foram construídas com dados de riqueza e rendimento recolhidos dos finais do século XIX e princípios do século XX. Piketty usou dados do século XIX até ao início do século XXI, uma série temporal mais ampla. 

Piketty observou que ao longo da história o retorno do capital – significa lucros ou juros ganhos em investimentos financeiros – geralmente excede o crescimento global de toda a economia. Os retornos de capital mantiveram-se relativamente constantes à volta de 5% para quem possuía ouro, ações, terras ou investimentos. O crescimento da economia ao longo dos séculos anteriores rondou sempre pouco mais do que 0%, excetuando se os 2 últimos séculos, com crescimento anual a rondar o 1 e 2 %. 

Vamos ver um exemplo hipotético entre duas personagens: a Vera e o Bruno. Ambos têm um rendimento anual igual de 20.000 euros, que gastam praticamente tudo com as suas despesas familiares. No entanto, a Vera herdou 10 milhões de euros, assim aplicando a média anual de rendimento de capital, todos os anos ela tem 500 mil euros disponíveis. Ao fim de 10 anos a Vera poderá acumular até um total de 15 milhões de euros e o Bruno, por muito que trabalhe, terá a hipótese de em 10 anos acumular alguns milhares de euros. Os proveitos económicos deste sistema tendem a ficar nas mãos dos grandes proprietários, não porque fazem alguma coisa extraordinária no mundo económico, mas apenas por serem proprietários. Uma coisa é ser empreendedor, outra coisa é ser herdeiro de fortunas. 

Neste link de acesso aos dados da Reserva Federal Americana (ver https://www.federalreserve.gov/releases/z1/dataviz/dfa/distribute/table/) podemos observar a distribuição da riqueza entre os Top 1 % e o conjunto de 50% da população com menos rendimento, desde dos anos 80 do século passado. É visível o crescimento do fosso entre os super ricos e os mais pobres, numa sociedade que se industrializou há muito tempo. 

Outra questão, a riqueza acumulada em excesso raramente é utilizada de forma produtiva, acabando no mundo da especulação e do jogo. A maior parte do dinheiro é utilizado em atividades especulativas, focadas na acumulação de dinheiro no curto prazo, sem benefícios tangíveis para a sociedade. O dinheiro é um recurso, que deve ser usado de forma eficiente para a sociedade e não pode ser desviado da economia real. 

A acumulação de riquezas nas mãos de alguns e o poder económico inerente não é bom para o desenvolvimento de uma economia harmoniosa, onde todos possam sentir que as suas necessidades estão a ser atendidas e poderem viver uma vida digna e com tempo para outras atividades como seres humanos. 

Como o sistema não resulta no longo prazo, a economia acaba por apresentar crises cíclicas, para sofrimento de uma grande parte da população, com o desemprego, com a falta de rendimentos dignos e o recurso ao Estado acaba por acontecer muitas vezes para salvar o capitalismo, com transferências de dinheiro fora dos mecanismos do mercado. 

A qualidade na vida pública é aferida por um sistema de governo com partilha do poder e a sua fiscalização (“Check and Balances”), que teoricamente seria conseguido pela democracia política, para que através da discussão bem fundamentada fossem tomadas as melhores decisões para a sociedade num determinado momento. Contudo o poder económico de alguns pode capturar o processo de decisão público e os caminhos a seguir acabam por beneficiar os seus interesses e não das pessoas como um todo. As estatísticas demonstram que para ser eleito para o congresso dos EUA é necessário que o candidato tenha mais dinheiro para a sua campanha, do que os restantes. E 65 % dos fundos são provenientes de 1% dos mais ricos da sociedade norte-americana. Assim quem está com o poder de tomar decisões que regulam a sociedade está desde logo comprometido com alguns interesses particulares. 

A limitação à acumulação de riqueza, sem o consentimento da sociedade, é um requisito para a construção de uma economia mais equilibrada, mais ecológica e mais justa. Deste Princípio nascem então um conjunto de políticas que ajudam a alcançar este objetivo. Em futuros artigos analisaremos estas e quais as que devem ser implementadas. 

Francisco Dinis, Membro da Equipa do “Prout Research Institute Portugal” 

Shanti Agostinho1º Princípio de Prout – Não deve ser permitida a acumulação de riqueza, sem a permissão da sociedade
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A necessidade de uma nova Economia – Os 5 Princípios Orientadores de Prout 

Este artigo foi construído com excertos do Livro “Despertar para uma Nova Economia” de Roar Bjonnes e Caroline Hargreaves e é uma introdução a uma série de artigos a publicar sobre os 5 Princípios Fundamentais de Prout.

  O capitalismo está “entubado” numa Unidade de Cuidados Intensivos, para mais uma tentativa de reanimação, após as graves insuficiências demonstradas. Devido às consequências deste sistema económico, como a destruição da natureza, a casa que nos suporta enquanto espécie e as disparidades não racionais na distribuição da riqueza criada, precisamos de despertar para uma nova economia com novas estruturas, num sistema para além do capitalismo.

 A economia é uma ciência social, não se deve limitar a descrever a realidade atual tal como ela é, mas também deve incluir a nossa vontade do que desejamos que venha a ser a realidade. Primeiro temos que decidir em que sociedade queremos viver e depois criar leis e estruturas para trazer esse mundo à existência. Filosofia, Política e Economia são potenciais ferramentas de construção de mundo e não de sistemas subservientes a interesses particulares, nem devem ser utilizadas para meros gestores do status quo, principalmente quando este não dá respostas às necessidades das pessoas. 

 Pretendemos o quê? Um mundo de direitos iguais para todos, com uma parte justa dos recursos para cada, com oportunidades de desenvolvimento pessoal ou um mundo de privilegiados à custa de de mecanismos de supressão e de exploração dos outros?

 Muitos escritores e filósofos propuseram desenvolver uma sociedade mais justa, mas não apresentaram um sistema político e económico coerente. Por exemplo, Karl Marx deixou um espaço vazio entre os seus ideais socialistas/comunistas e os meios para alcançar. Como seria o futuro de uma economia socialista/comunista? Como se daria a transição para um Estado socialista/comunista? Existe pouco investimento de Marx para responder a estas questões, parece que ele assumiu que a simples exposição e a compreensão dos males do capitalismo seriam suficientes para que um novo sistema emergisse, quase que por artes mágicas.

Um leque variado de economistas contemporâneos em diferentes áreas, como no socialismo e na economia verde, estão de acordo que o atual sistema é insuficiente e são necessárias reformas profundas:

Economistas críticos do sistema Capitalista:

 – Thomas Piketty

– Eric Reinert

 – Ha-Joon Chang

Economistas Verde:

 – E.F. Schumacher

– Herman Daily

Mas tem havido poucas propostas de modelos económicos para substituir o atual. Uma destas propostas raras é apresentado pelo filosofo indiano PR Sarkar na sua Teoria de Utilização Progressiva, que combina o melhor do capitalismo com o socialismo, definindo uma nova base de valores e muitas novas características económicas para além dos sistemas referidos.

Para fazer crescer uma nova economia, devemos ter uma nova visão da sociedade em que queremos viver. Perante esta visão devemos criar mecanismos, políticas e regulamentos para a sua construção. A visão de Sarkar é clara: um lugar de cooperação mutua onde cada indivíduo tem oportunidade de desenvolver o seu potencial máximo em todas as esferas da existência – física, mental e espiritual.

Foi idealizado um mundo onde as necessidades físicas de todos são garantidas pela sociedade, mas em troca cada indivíduo é obrigado a contribuir, de acordo com a sua capacidade, na construção desse mundo.

 Embora a decisão de fornecer os requisitos mínimos a todos os membros da sociedade possa ser considerada ética ou política, a capacidade de cumprir essas promessas está sob a esfera da economia. O sistema económica proposto por Sarkar foi cristalizado em 5 princípios fundamentais. São simples e profundos, no entanto nenhum destes princípios é aplicado no campo da economia. Os próximos artigos serão uma síntese destes.

Estes princípios fundamentais são regras básicas para a sociedade viver. Eles representam as ideias gerais necessárias a uma economia equilibrada, mas não são políticas, porque estas mudam. Pelo contrário, são fórmulas económicas gerais, princípios de ampla visão, dos quais emergirão políticas económicas concretas. Em vários momentos e condições, estes princípios podem ser implementadas de maneira diferente.

            Quais são estes princípios a serem abordados nos próximos artigos?

                        1. Não deve ser permitida a acumulação de riqueza, sem permissão da sociedade

                        2. Deva haver a máxima utilização e distribuição racional dos recursos materiais, intelectuais e espirituais.

                        3. Deve haver a máxima utilização das potencialidades físicas, intelectuais e  espirituais do indivíduo e do coletivo.

                        4. Deve haver um ajustamento equilibrado entre as utilizações físicas, intelectuais e  espirituais.

                        5. As utilizações dos recursos devem variar de acordo com as mudanças no tempo, espaço e pessoa; as utilizações devem ser progressivas.

Francisco Dinis

Membro da equipa de Prout Research Institute de Portugal

Shanti AgostinhoA necessidade de uma nova Economia – Os 5 Princípios Orientadores de Prout 
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Plano de Desenvolvimento Regional da Cova da Beira

A necessidade de um planeamento local racional e fundamentado para cada região está a tornar-se cada vez mais evidente para que possamos alcançar um desenvolvimento sustentável global, que garanta o bem-estar de todos. 

            Todo o conceito de globalização económica está ser minado por eventos históricos de evidenciam a fragilidade da estrutura, com as ruturas das cadeias logísticas de produção e distribuição, com a situação de guerra afetando o sector de energia e da produção alimentar, com aumento de desigualdades económicas dentro de diferentes sociedade e entre regiões. A necessidade de criação de regiões resilientes, com capacidade de resistir a choques provenientes do exterior, está sobre a mesa.

            Desde 2020 o Prip está a preparar o terreno para um processo participativo para criar um plano de desenvolvimento integral para a Cova da Beira (Belmonte, Covilhã e Fundão), que irá progressivamente utilizar e valorizar os recursos endógenos da região, tanto humanos como naturais, e que permitirá o despoletar de ações concretas para impulsionar a economia local, aumentar o nível e a qualidade de vida da população residente e elevar a resiliência económica regional.

            Este será um processo de planeamento que depende do envolvimento da comunidade local, pelo que se destina a incluir instituições governamentais (municípios) e não governamentais de várias esferas (empresarial, cooperativas, educacional, social, cultural, saúde, etc.). Este processo participativo será a base para a construção de soluções  emergentes e a força motriz para a implementação de ações que visam a resiliência da Cova da Beira .

            Do trabalho coletivo surgirão propostas que pretendem servir de soluções práticas para os problemas sociais e económicos vividos pela população da Cova da Beira e assim promover o desenvolvimento desta bio-região.

Metodologia

            O trabalho envolve 4 fases a saber:

Fase 1 Recolha de Dados

            Recolha de dados estatísticos a nível nacional, regional e local e enquadramento a nível europeu;

            Resumo dos dados sobre a região e conclusões iniciais;

            Envolvimento da comunidade, organizações governamentais e não governamentais locais, líderes locais, etc;

            Entrevistas às partes interessadas;

Fase 2 Análise de Dados

            Compilação e revisão de dados estatísticos com base nos resultados da entrevista

Fase 3 Planeamento/ Criação de propostas 

            Criação da “visão da Cova da Beira

            Dar prioridade às soluções a serem trabalhadas; 

            Formulação de estratégias, ações concretas, projetos, políticas, etc., para o desenvolvimento da região da Cova da Beira, por grupos de trabalho;

            Enquadramento da estratégia do Plano de Desenvolvimento Regional (PDR), dentro de uma visão ampla;

Fase 4 Implementação de ações

            Os grupos trabalham em ações/projetos concretos que põem em prática as propostas apresentadas;

            Acompanhamento dos trabalhos em sessões plenárias coletivas;

            Relato dos resultados do PDR;

            Estas fases não são estanques, a sequência de uma fase para a seguinte não é linear e o que acontece exatamente em cada fase será definido pelo conjunto de intervenientes. Estamos atualmente na fase 2 ao terminarmos a revisão da primeira ronda de entrevistas, e ao mesmo tempo continuamos com mais entrevistas e contactos com as partes interessadas que queiram aderir e estar envolvidas no PDR.

Entrevistas às partes interessadas 

            Nas entrevistas individuais com as partes interessadas, feitas através de uma conversa, na sua maioria presencial e informal, abordámos a perceção e o sentimento sobre os principais desafios da região, que soluções podem ser sugeridas ou em que soluções algumas já estão a funcionar, que áreas de melhoria são identificadas e que potencial é reconhecido na região. Foram também identificadas várias potencialidades ou recursos inexplorados na Cova da Beira.

            Até ao momento foram entrevistadas as seguintes Instituições:

Organizações Académicas, de Educação e de Investigação

            Universidade da Beira Interior

            Escola Profissional do Fundão

            Observatório para a Economia e Desenvolvimento Social

Cooperativas e Associações Agrícolas 

            Associação BioEco

            Cooperativa Agrícola de Olivicultores do Fundão

Associações Empresariais 

            Associação Empresarial da Beira Baixa

            Associação Empresarial Covilhã, Belmonte e Penamacor

Associações Culturais

            Associação Cultural da Beira Interior

Movimentos Ambientalistas

            Movimento Académico para a Proteção Ambiental 

Instituições Governamentais

            Câmara Municipal de Belmonte

            Câmara Municipal da Covilhã

            Câmara Municipal do Fundão

Organizações de Inovação

            Living Lab da Cova da Beira – Incubadora a Praça

Associações de Desenvolvimento Rural

            ADERES

            Beira Serra

Organizações Sociais e Humanitárias

            Santa Casa da Misericórdia de Belmonte

            Santa Casa da Misericórdia da Covilhã

            Santa Casa da Misericórdia do Fundão

Organizações de Turismo

            ADXTUR – Agência de Desenvolvimento Turístico das Aldeias de Xisto

Ponto de Situação e Futuros Passos

            Depois da Fase 2, vamos entrar na Fase de Planeamento e Criação de Propostas com as instituições e pessoas interessadas, divididas em grupos de trabalho a partir do próximo mês de Setembro. Entretanto estamos a organizar sessões de auscultação de cidadãos sobre estas temáticas, tendo sido realizados até ao momento 2 eventos na Cooperativa Coolabora na Covilhã e no Mercado Eco de Alpedrinha, no concelho do Fundão.

            Para saber os resultados preliminares do trabalho e mais informação detalhada, pode consultar o relatório disponível neste site.

Francisco Dinis

Membro da equipa do Prout Research Institute de Portugal

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Descentralização económica, a chave para um desenvolvimento regional económico harmonioso.

Segundo Maslow as nossas necessidades humanas estão hierarquizadas, ou seja as de base devem ser satisfeitas primeiro para que as necessidades mais subtis possam ser preenchidas. Assim alguém com fome (um caso extremo), nunca poderá desenvolver o seu potencial humano e assim contribuir para a sociedade. Sem desenvolvermos relacionamentos saudáveis também não podemos subir nessa Pirâmide. Devemos perceber que só teremos uma sociedade a funcionar para o benefício de todos se for constituída por indivíduos saudáveis e só teremos indivíduos socialmente úteis se a sociedade for saudável, o inverso também é verdadeiro, um caminho de degeneração coletiva e individual reforça se mutuamente. 

         É preocupação em Prout que todas as necessidades básicas de cada indivíduo sejam atendidas, e que  haja um Progressivo uso dos recursos (físicos, mentais e espirituais) para que exista um verdadeiro progresso, ou seja que todos possam utilizar o seu potencial e assim poder servir a tudo e a todos. É uma visão não materialista, ao contrário do capitalismo onde a acumulação de riqueza é a prioridade, mesmo que isto implique a exclusão do atendimento das necessidades de outros seres, humanos e não humanos, mesmo que provoque uma destruição ambiental irreversível, na fé de que algum desenvolvimento tecnológico a consiga evitar.

         Como o sistema atual não consegue criar uma sociedade justa, ecológica e pensada para o desenvolvimento de todos, a necessidade da sua substituição torna se cada vez mais premente. O capitalismo está pensado para que os detentores do capital, principalmente os grandes, possam acumular a riqueza e tomar as grandes decisões económicas; o que produzir, quantidades, quem trabalha, quanto cada um recebe, que regiões se desenvolvem, etc. 

         As maiores desigualdades sociais e a pressão ecológica estão a deixar um enorme desconforto na maior parte das pessoas, a possibilidade de ascensão social que o sistema proporcionava no passado é cada vez mais uma miragem. Devido aos cálculos de maximização de lucros para alguns, foram tomadas decisões a uma escala global, que tornam as nossas sociedades vulneráveis. Neste momento a cadeia logística de distribuição está a deixar de funcionar de forma eficiente, com cada vez mais atrasos na entrega de produtos e mesmo escassez de outros. Agora é a própria produção e distribuição de alimentos que está em causa e a elite política/económica está assustada, porque sabe que historicamente a insegurança alimentar é a gota de água que faz com que as massas populares passem a exigir mudanças drásticas e desencadeiam  perturbações graves, com consequências políticas e sociais.

         Exemplos práticos do contexto histórico atual, a “fábrica do mundo” passou a ser a China a partir do ano 2000 e com a pandemia e as suas restrições a cadeia logística mundial passou a ter problemas graves. Para além da perda de empregos no sector industrial estáveis no ocidente, os consumidores passam a ter muitas incertezas sobre a disponibilidade e o tempo de entrega dos produtos pretendidos. O fenómeno de inflação e a deflagração da guerra entre a Ucrânia e a Rússia, dois produtores de grande peso a nível mundial de matérias-primas para a agricultura, de energia e de alimentos, está a tornar a vida complicada a muitas pessoas, incluindo as que vivem no mundo desenvolvido. 

         Assim, apelos e ações de relocalização de indústrias passam a estar em cima da mesa. Cadeias de fornecimento mais curtas, mais perto de casapara evitar dependênciasA resiliência regional passa a ser uma prioridade.

         A ideia de comércio livre foi defendida ou mesmo imposta em tratados após “pressão militar” (Reino Unido – China século XIX), negando se assim a possibilidade de industrialização das nações mais atrasadas economicamente, um requisito básico para o desenvolvimento de qualquer sociedade. É de notar que no início da revolução industrial no Reino Unido a indústria foi protegida por tarifas altas da concorrência exterior, o mesmo acontecendo nos EUA durante o século XIX e princípios do séc. XX. Quando estamos numa posição de vantagem económica é fácil de defender que os outros aceitem o chamado comércio livre, exportamos bens de elevado valor em troca de matérias-primas, provocando desequilíbrios económicos graves entre países e regiões. 

         No contexto de acordos internacionais de comércio livre, as nações economicamente mais fracas nunca terão hipóteses de desenvolver o seu tecido industrial. Deste modo, muitos países pouco desenvolvidos economicamente têm uma economia centrada em alguns bens de baixo valor agregado para exportação ou vivem do sector dos serviços, como o turismo e com uma elevada taxa de importação de produtos industriais. Os recursos locais não são utilizados para desenvolver a economia internamente para benefício dos habitantes que aí vivem, mas para pessoas do mundo dos negócios, que muitas vezes vivem a milhares de quilómetros de distância. As ideias e as práticas de comércio livre devem ser abandonadas a favor de um comércio justo, que deve acontecer apenas entre regiões economicamente equiparadas. 

         Assim a Teoria de Utilização Progressiva torna se muito útil para apontar caminhos a seguir neste momento histórico:

         Criação de zonas sócio económicas para um desenvolvimento mais harmonioso. Um dos grandes problemas do capitalismo é o desenvolvimento económico desequilibrado entre diferentes regiões, e entre países, onde alguns tornam se muito ricos à custa do uso de outras regiões e da exploração de muitos seres humanos. Em termos históricos a revolução industrial permitiu a acumulação de riqueza devido ao avanço tecnológico, mas utilizou as matérias-primas das colónias para serem processadas na metrópole e reenviar os produtos acabados de volta para as colónias para serem vendidos. O sistema foi pensado para que as colónias não pudessem desenvolver a sua indústria e estar dependentes da metrópole, pois existiam leis que assim proibiam.

         Para serem desenhadas no mapa, estas zonas sócio económicas devem ter os mesmos problemas económicos a resolver, os habitantes dessa zona devem ter um legado sentimental comum, uma área com extensão suficiente que permita ter recursos em quantidade para um desenvolvimento regional auto suficiente e uma continuidade geográfica. O conceito atual de Bio Região é semelhante (Economia Donut).

         É muito importante em Prout para o desenvolvimento destas zonas, que as diferentes expressões da cultura tradicional sejam respeitadas, para evitar sentimentos de inferioridade de determinados grupos. A tática de suprimir línguas de determinados grupos étnicos e outros aspetos culturais dos habitantes nativos foi muita vez utilizada por invasores e mesmo dentro do próprio país, por questões de controlo político centralizado. Dentro de cada região devem ser abolidas leis e pseudo valores que promovam a injustiça social e grandes disparidades económicas entre as pessoas.

         Quais os objetivos económicos a alcançar nestas regiões sócio económicas?

         – Obter um desenvolvimento económico equilibrado através de um planeamento descentralizado, de forma a permitir um crescimento económico acelerado beneficiando os habitantes destas regiões, respeitando o ambiente.

         – Eliminação total do desemprego e aumento do poder de compra, através de uma distribuição racional de bens produzidos.

         – Redução das desigualdades económicas através de políticas fiscais e impostos, estruturas salariais mais equilibradas, para um crescimento económico acelerado.

        –  Um sistema de Segurança social para a saúde, educação, desemprego e pensões. Contudo é necessário não criar situações de dependência deste sistema.

         – Estabilidade de preços e manutenção de uma competição justa entre produtores.

        –  Desenvolvimento de uma estrutura económica baseada em propriedade privada para empresas de pequena dimensão e em áreas de bens não essenciais, propriedade comunitária na forma de cooperativas e empresas estatais na denominadas indústrias chave, de maior dimensão.

         Planeamento nas zonas sócio económicas.

         Planeamento pode ser definido como um esforço consciente para dirigir a energia humana para alcançar um determinado fim, de forma racional. Cada plano é um programa de ação com objetivos e um método. Um planeamento de desenvolvimento regional relaciona se com uma determinada área geográfica e um momento temporal.  Este deve identificar os recursos disponíveis na região, alocando estes diferentes tipos, os naturais, os humanos e os financeiros, atendendo às características psicológicas e culturais das pessoas para quem o plano é desenhado. Um das características de planeamento em Prout é a participação das pessoas locais na sua elaboração. Estas zonas podem exportar os seus excedentes com outras áreas. Só poderemos integrar zonas sócio económicas quando estas apresentam o mesmo grau de desenvolvimento económico.

         Para um planeamento efetivo cada área sócio económica deve ser dividida em sub áreas, sendo constituídas por Blocos, ou seja locais com até 100 000 habitantes, o chamado Block Leval Planning. É claro que terá que haver coordenação no planeamento entre os blocos, até ao nível regional. O Prout Research Institute de Portugal está a coordenar uma ação de planeamento a nível de Bloco, na Cova da Beira envolvendo os municípios de Belmonte, Covilhã e Fundão. Inicialmente foram levantados um variado leque de estatísticas, desde da educação, população, economia, agricultura, saúde, etc, a nível nacional, da região centro e dos municípios referidos. Foram identificados depois da análise dos dados da região problemas e potencialidades. 

Neste tipo planeamento é muito importante a participação de atores (institucionais e individuais) envolvidos na atividades quotidianas. Assim, decorreu uma série de entrevistas sobre a perceção dos problemas e potencialidades da Cova da Beira, participando nestas a Universidade da Beira Interior, os 3 Municípios e um conjunto de associações, empresas e cooperativas locais.  Agora está a decorrer a fase de procura de soluções e elaboração de um plano de desenvolvimento através de método participativo entre os interessados, envolvendo instituições com recursos e “know how” para.  Um exemplo local do sucesso desta metodologia participativa é demonstrado por nos anos 70 e 80 do século XX um grupo de pessoas e instituições estiveram envolvidas num processo de coordenação para o desenvolvimento desta região e alguns resultados apareceram no mundo real para benefício local, como são exemplos a criação da Universidade na Covilhã (UBI) e o regadio agrícola da Cova da Beira.

         Planeamento descentralizado regional é essencial para substituir o atual planeamento económico centralizado, que dá prioridade aos interesses privados dos muito poderosos, pois o resto é “paisagem” não valorizada. Só assim poderemos planear o desenvolvimento das regiões para o benefício de todos.

         As vantagens sócio económicas concedidas pela Teoria de Utilização Progressiva só podem ser maximizadas quando houver um contexto político e económico adequado. Na atual estrutura capitalista decorrentes dos tratados da União Europeia, baseada nas ideias de comércio livre, Portugal nunca terá hipótese de ter um desenvolvimento sócio económico verdadeiro, pois as indústrias nacionais nunca poderão florescer. Resta nos os sectores dos serviços, incluindo o turismo, do comércio e de uma agricultura dependente de subsídios para sobreviver. Enquanto Prip, no meio desta realidade estrutural, é mesmo assim nossa obrigação contribuir para que as populações residentes em Portugal possam ver os seus padrões de vida melhorados, criando condições coletivas para que cada um possa subir mais facilmente a Pirâmide de Maslow.

Francisco Dinis

Membro da equipa do Prout Research Institute de Portugal

Shanti AgostinhoDescentralização económica, a chave para um desenvolvimento regional económico harmonioso.
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Como melhorar a Democracia Hoje? Com uma nova Visão…

O conceito de democracia pressupõe que os sujeitos afetados por uma decisão tenham algo a dizer ou algum poder para influenciar a decisão final. Estamos habituados a ter um voto na eleição dos candidatos a cargos públicos de 4 em 4 anos e assim influenciar o nosso destino coletivo.

Apesar da experiência democrática da Grécia na antiguidade, com características peculiares, o sistema democrático atual nasce da luta entre o poder absoluto das monarquias (sistema feudal) e o desejo de controlar e de limitar esta estrutura política, especialmente pela classe das pessoas de negócio, pois aquele sistema era bloqueador das suas atividades. Assistiu-se à procura de liberdade pessoal perante esse desenho político. As revoluções Francesa e Americana são momentos marcantes e mais conhecidos nos processos de limitação do poder absoluto em termos históricos, mas em Inglaterra, mais de cem anos antes, um rei absoluto perdeu também a cabeça como resultado desta luta, entre o sistema absolutista e parlamentar. Uma corrente filosófica assim foi desenvolvida, com o nome de Liberalismo. Quais as suas características?


Liberdade de Expressão
Liberdade de Imprensa
Liberdade Religiosa
Mercados Livres
Direitos Civis
Sociedades Democráticas
Separação entre Estado e Religião
Igualdade de Género
Cooperação Internacional

Qual a racionalidade na Filosofia Política Liberal? E o porquê da necessidade de disseminação das democracias liberais, recorrendo à força se necessário? (1)


O centro dessa filosofia é o indivíduo, a sua liberdade e um conjunto de direitos inalienáveis, ou seja aplicados a todos os seres humanos. Assim é necessário espalhar a democracia para a proteção dos direitos humanos, que passam a ser mais importantes do que as nações e o seu contexto cultural e histórico. Se um regime político está a matar o seu povo (na realidade ou na propaganda), então a filosofia defende a necessidade e a legitimidade de invadir esse país, mudar esse regime e substituir por uma democracia liberal. O espírito de cruzada está presente, mudar o mundo para “melhor”, recorrendo à violência militar, se necessário.


Outro argumento para a disseminação dos regimes liberais é a dita capacidade de trazer a paz internacional, como depois do choque da destruição da II Guerra Mundial. Aqui na teoria liberal entra o conceito de tolerância e respeito pelos direitos dos outros indivíduos que são diferentes. Isto permite a ausência de violência entre grupos humanos. Assim o Estado Liberal é chamado a redigir um contrato social e torna se assim uma Autoridade Superior que garante que esses direitos de cada indivíduo sejam respeitados, porque sem esta organização seria a anarquia ou o tribalismo e não havia direitos para ninguém.

Agora exemplos recentes de implementações no mundo real destas ideias liberais e consequências?

A “cruzada” global para a disseminação de certos ideais é facilitada quando estamos num mundo unipolar, na presença de uma grande potência económica e militar, que pode agir sem grandes restrições. Tal aconteceu até há bem pouco tempo com o EUA, depois da queda da União Soviética, surgiu um período de 30 anos de hegemonia norte americana. Com as ameaças (reais ou não) de proliferação nuclear (Irão e Coreia do Norte, por exemplo) e terrorista do médio Oriente, os EUA decidiram optar por mudanças de regimes nessa parte do globo, tirando partido da sua vantagem histórica (ver Wolfowitz Doctrine – 2). Invasões no Afeganistão e Iraque, seguidos por ações contra o Irão, a Síria, Líbia etc, iriam tornar esta zona conturbada num oásis de paz e estabilidade, pois teriam democracias, os direitos dos indivíduos seriam respeitados e a tolerância seria um facto adquirido (3). Todas estas construções mentais caíram por terra com a realidade que todos nós conhecemos. Ódios, ressentimentos, confusões, morte, destruição, refugiados e o sem fim sofrimento que as guerras trazem, foram o resultado dessa política tecida no “céu liberal”. Mas do ponto de vista Ocidental todos estas consequências ficaram algo lá longe, do outro lado do mundo:
“longe da vista longe do coração…”


Agora estamos novamente em guerra, não numa parte de mundo distante, mas na Europa. E claro, para nós Ocidentais há um grande choque, porque é no continente que aplicamos os conceitos da filosofia liberal após a grande destruição da II Guerra Mundial. Nas nossas mentes havia uma sensação de segurança, há mais de 70 anos não havia este nível de conflito, exceção aquando dos eventos na antiga Jugoslávia nos anos 90, mas sem grande impacto na vida dos outros países. Paz, tolerância, respeito e criação de riqueza dentro do sistema sócio económico capitalista pareciam ser a receita e a prova do que as doutrinas baseadas nas filosofias liberais funcionavam. O que aconteceu para perdermos o “paraíso”?

Más experiências democráticas e ascensão de outros poderes na cena mundial, com outros valores…

Para além da tentativa de implementação no Médio Oriente, a democracia Liberal foi experimentada também na Rússia nos anos 90, com resultados pouco favoráveis, com o aumento da pobreza, da criminalidade, do enriquecimento ilimitado de alguns (oligarcas), entrada das multinacionais estrangeiras, etc. O Estado tornou-se fraco, o seu líder democrático Yeltsin tinha dependência com o álcool e o controlo da Rússia por interesses estrangeiros foi mais do que evidente. Depois desta experiência democrática “traumatizante”, a Rússia escolheu um líder com outras características: forte, nacionalista e pragmático. Reorganizou o país e apesar de não ser uma potência económica global, a sua vontade, realisticamente deve ser escutada, pois armas nucleares andam por aí. A Rússia segue o caminho do nacionalismo, que é um sentimento que une pessoas e está fora da lógica de pensamento liberal, sendo pensado para ser global e não reconhecer as fronteiras, a história, as tradições e a cultura de cada país.

Outra história de outro país, neste mesmo período de tempo, é a China, que depois da sua entrada por volta do ano 2000 no sistema internacional do comércio, tornou-se na fábrica do mundo. O que pesou muita nesta decisão foram os cálculos dos capitalistas, de quanto iriam ganhar ao fazerem os seus investimentos nesse País, em vez de o fazerem na Europa ou nas Américas, como por exemplo: mão de obra mais barata, poucas ou nenhumas restrições ambientais, etc … resumindo, uma receita para a maximização dos lucros, o mais rápido possível. Contudo, o regime continua a ser de um partido comunista, sem a grande ideologia tradicional, mas representa um Estado forte e centralizador. Ou seja pode-se fazer negócios, mas há um regulador forte, que pode mudar as regras do jogo, se o “interesse nacional” assim determinar. Antes da crença no sistema capitalista, onde uma classe social é adorada e privilegiada, a China segue também o caminho do nacionalismo, focada numa tradição histórica e numa visão do mundo própria.

A América de Trump tinha também esta proposta, voltar à nação. E é claro que com tantos eleitores que perderam poder de compra e empregos nesse país devido ao processo de globalização económica, o discurso de “América Primeiro” ressoou no coração de muitos. O Brexit foi também um “grito” para o regresso do Reino Unido ao espaço nacional. Neste contexto de descontentamento de camadas da população no mundo ocidental pelos resultados das políticas liberais presentes no processo de globalização, a ascensão da China e a implementação de acordos globais como os BRICS (Brasil, Russia, Índia, China e África de Sul) estão a abrir espaço para um mundo multipolar, mais regional, fora do contexto da ordem internacional desenvolvida em Bretton Woods (1944).


Por isso esta guerra é mais complexa do que a narrativa que estamos perante um louco, megalómano e tirânico, e que os Russos vão se revoltar, retirar o ditador e implementar um regime liberal e tudo volta atrás. Na realidade este é mais um episódio, com graves consequências, de uma luta pela hegemonia mundial, entre o sistema ocidental com os seus valores e a ascensão de uma potência rival a China, que coloca em xeque o status quo global a que estávamos habituados.

Não vamos entrar em grandes detalhes, mas parece que não existe vontade de evitar o escalar do conflito na Europa, expressões de “lutar até ao último Ucraniano”, por parte de responsáveis estrangeiros, demonstram o interesse em perpetuar a guerra por interesses geo políticos, com o risco de uma espiral de violência que poderá envolver outros países, que vão acabar por levar os europeus e não só, a viver dificuldades económicas – visível até agora nos custos dos combustíveis e em produtos alimentares. Para além da destruição física e humana esta guerra, como todas, poderá gerar ódios que permanecerão connosco por algumas gerações.

O Liberalismo historicamente trouxe um conjunto de valores às sociedades ocidentais, que permitiram redesenhar o Estado, através do modelo democrático e de um novo contrato social, onde um conjunto de liberdades individuais inalienáveis são reconhecidas. Um sistema sócio económico surgiu dentro deste contexto, onde a classe social dedicada aos negócios tornou se livre para acumular poder económico. Por isso, tradicionalmente associamos democracia a desenvolvimento económico e a bem estar material para a sociedade, só que em vez de serem os aristocratas ou os intelectuais a controlarem o Estado, são os membros da classe com maior poder económico a fazê-lo hoje em dia, com cada vez mais prejuízo para as outras classes, bem como para a natureza.

Nesta encruzilhada histórica, que é exemplificada neste conflito na Europa, ou voltamos aos nacionalismos, às nossas paróquias, ou continuamos a destruir o planeta com palavras bonitas ou encontraremos algo novo. A Teoria de Utilização Progressiva apresenta soluções a ter em consideração. Por exemplo, para existir uma verdadeira Democracia política o eleitorado deve ser educado, ou seja não ser facilmente manipulado por demagogos, ou pelos interesses de determinados grupos. Os candidatos aos cargos públicos deveriam ser reconhecidos pela sua base ética e a informação deve ser transparente, para que um debate esclarecedor possa ajudar a tomar decisões mais adequadas. Neste momento, em certos países, para um candidato ter hipótese de ser eleito tem que contar com apoio financeiro avultado, dando azo a uma série da favores e interesses particulares a salvaguardar, que muitas vezes vão contra o interesse do coletivo. Também muita propaganda e narrativas são construídas para iludir as pessoas sobre a realidade e criar ambientes emocionais para que determinada decisão seja tomada e certos grupos possam continuar no poder.

Nesta era tecnológica, um sistema de ordem internacional deverá ser encontrado, mais socialmente justo e ecológico. Para tal uma filosofia deverá existir para servir de suporte a esse arranjo mundial, em que os países e as pessoas possam perceber a sua racionalidade, para assim mobilizarem a sua energia nessa construção. Uma ordem internacional que não seja determinada por uma classe social, na ânsia de controlar mais recursos, por razões de domínio económico, nem por uma nação militarmente forte, será necessária para desenhar um outro mundo, com as instituições adequadas para tal.

O Neo humanismo é um forte candidato a ser essa filosofia, com a sua visão da natureza humana, reconhecendo a dimensão espiritual da nossa realidade, contrapondo às visões materialistas que moldaram as vidas sociais nos séculos XIX e XX (Comunismo e Capitalismo). Nesta filosofia todos os seres são importantes por apenas existirem, incluindo os do mundo não humano, o que guiará no desenho de soluções para os problemas da sociedade humana. Esperamos que perante cenários de destruição global e ameaças de extinção, os princípios de Prout possam ser aplicados, evitando-se o foco na criação de poderes centralizadores políticos e económicos, apostando-se na criação de estruturas de tomada de decisões mais descentralizadas, mais próximas das pessoas, mais próximas da realidade…

Mas mais importante do que a democracia política é a democracia económica, tópico a ser explorada no próximo artigo, em que se propõe o abandono do sistema capitalista, não porque é giro, mas por necessidade, cada vez mais urgente…

Francisco Dinis
Membro da Equipa do Prout Research Institute de Portugal

Notas:
(1) – https://www.youtube.com/watch?v=ESwIVY2oimI&t=1685s
(2) – https://en.wikipedia.org/wiki/Wolfowitz_Doctrine
(3) – https://www.cato.org/sites/cato.org/files/articles/preble_rice_doctrine.pdf

Shanti AgostinhoComo melhorar a Democracia Hoje? Com uma nova Visão…
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Agir localmente pensar globalmente

Por Lísia Castro
(texto original)

Quando abordamos um problema social complexo, cujas soluções dependem de profundas transformações no modo como pensamos a agimos na realidade, pode soar utópico imaginar o mundo sem este fenômeno. Imagine um mundo sem pobreza, sem fome, sem exploração. Talvez não nos sintamos capazes de atuar em todas as frentes que julgamos necessárias para enfrentar o problema, ou em integrar tantas dimensões e agir de forma coordenada, ou as vezes simplesmente pensamos que esse esforço já está sendo realizado pelos governos mundiais ou por uma organização importante, de forma planejada, eficaz  e global, e que os resultados virão mais cedo ou mais tarde. Pode ser até que pensemos que o problema é parte indissociável desta realidade, e que por exemplo, é preciso que haja pobreza, para que haja riqueza. É preciso que a desigualdade se perpetue, para que os indivíduos exerçam sua liberdade, progridam pelo mérito e pela competição. Mas todas esses caminhos são estáticos, conduzem à inércia, deixam o indivíduos de mãos atadas.

Cerca de 1,3 bilhão de pessoas de 101 nações analisadas pelas Nações Unidas no ano de 2019 são consideradas “multidimensionalmente pobres”. Em relação a pobreza extrema, caracterizada por aqueles que vivem com menos de US$ 1,90 por dia, a pandemia da COVID-19 poderá acarretar um aumento de 88 milhões a 115 milhões de pessoas vivendo nessas condições. O sentimento mais comum frente a essas estatísticas é de impotência. Não fazemos parte da mesa redonda de esforços coordenados globais, não temos cargos políticos, resta-nos votar, muitas vezes com uma lista disponível de candidatos, que é como um cardápio com diferentes tipos de carnes para um vegetariano faminto: é preciso escolher o menos pior ou abster-se de escolher.

Como então fazer parte de uma mudança efetiva?

Há uma forma: em um sistema em que as soluções locais sejam as soluções globais. Partir do simples, do que cada indivíduo é capaz de compreender como melhor forma de economia, de sociedade, de consumo, de troca, de existência, e ampliar esse sistema gradualmente. Este seria um processo de desalienação, em que todos são peças fundamentais de uma mudança global. Pensar localmente então será agir globalmente.

Prout, a Teoria da Utilização Progressiva, elaborada por P.R. Sarkar em 1959, traz em seus 16 princípios, dos quais 5 são considerados fundamentos, uma visão que nos permite pensar igualmente em como atuar nas localidades, e em como expandir essa atuação à níveis cada vez mais amplos, até um governo global, sem fronteiras, comprometido com o bem estar de todos os seres, através de um modelo de economia descentralizada.

Para compreender essa ideia, podemos utilizar o conceito de sintropia, explicado por Ersnt Gotsch, e que dá nome a agricultura que criou, com fantásticos resultados ao se trabalhar em sintonia com a natureza. Ao contrário da entropia, em que um sistema perde energia, e tende ao caos, ou seja, se torna menos complexo, a sintropia atua como a própria natureza, ganha energia percorrendo etapas de modo que o sistema adquire energia gradualmente, e em níveis suficientes para prosseguir rumo a sistemas mais complexos. É um esforço sustentado por diversos processos simples, que tornam possíveis níveis cada vez mais elevados de organização.

O progresso social caminha de forma semelhante, deve ser passo a passo, no ritmo da capacidade local, de acordo com a realidade de forma que possa ser sustentado no tempo e aprimorado pelos agentes internos desse meio, ou seja, a população local deve estar plenamente engajada nesse progresso, é ela que deve incorporá-lo. Isso envolve a utilização progressiva de uma série de recursos da forma racional, ou seja priorizando o bem estar dos seres humanos e do equilíbrio do planeta.

Esses recursos podem ser de ordem física, como matérias primas, acessibilidade do local, potencial agrícola, potencial industrial e de manufaturas considerando os recursos disponíveis, ou de ordem social e cultural local, ou seja, estão interligados nesse sistema níveis mentais, físicos, psíquicos que mostrarão os caminhos para a mudança, num sentido de autossustentabilidade em escala crescente, da organização cooperada e do progresso individual e coletivo.  Essa forma de transformação, enérgica mas coordenada, Prabhat Ranjan Sarkar chama de revolução nuclear.

O que podemos adquirir em nossa localidade? Como podemos fomentar o mercado local?  Com quem nos unir para ampliar o alcance dessas atitudes individuais? Que cooperativas de produção ou de consumo podem ser criadas para trazer renda e produtos de melhor qualidade a população local? O que podemos fazer para melhorar a saúde e bem estar da localidade em que vivemos? O que nos traz felicidade que podemos compartilhar? Que práticas regenerativas de agricultura podem ser aplicadas? Que tipos de escolas podem ser criadas de forma comunitária, que favoreçam o desenvolvimento pleno de crianças e adultos?

P.R. Sarkar considera tudo aquilo que constitui o ser humano e o desenvolvimento da vida em todas as suas manifestações, ao elaborar sua teoria socioeconômica. Neste sentido Prout envolverá conceitos de organização social, administração econômica, governança, considerando dimensões da ética, educação e espiritualidade.

Podemos abordar a espiritualidade dentro do contexto da filosofia Neo-humanista, teoria que está na base do pensamento de Prout. O Neo-humanismo nos fornece uma visão ecológica profunda, capaz de transformar a forma como refletimos sobre a realidade e a transformamos. Ela nos ensina a compreender a interdependência entre todos os seres, a unidade fundamental que se manifesta através da diversidade, o valor não apenas utilitário mas próprio de cada ser, a capacidade, responsabilidade e potencial que os seres humanos têm de contribuir com  o  desenvolvimento da vida que o cerca, suas limitações e fronteiras de pensamento que o separam de outras nações, outros povos, outros grupos, e principalmente, a manifestar o amor por tudo que é vivo e assegura a vida. E está é a base de PROUT, permitir a todos os seres o pleno desenvolvimento, a felicidade, a realização, e que esse compromisso não seja apenas individual, mas de todos com a coletividade, para que todos a desfrutem.

Segundo Sohail Inayatullah, pesquisador de Estudos do Futuro, professor da Universidade Tamkang em Taipei, Taiwan, e estudioso de Prout, devemos ter em perspectiva quatro dimensões ao analisar um problema. Sua teoria de análise causal em camadas classifica esses níveis em: litania, causas sociais, discurso ou visões de mundo e mitos ou metáforas. “A litania concentra-se em tendências e problemas quantitativos que muitas vezes são exagerados e usados ​​para fins políticos. Ao nível das causas sociais, a interpretação é dada aos dados quantitativos. O terceiro nível diz respeito à estrutura e ao discurso e visão de mundo que a apoia e legitima. No quarto nível, a análise busca as histórias profundas, os arquétipos coletivos, a dimensão subconsciente da questão sob investigação.” (Ivana Milojević)

Ele nos mostra que há uma interdependência nessas quatro perspectivas, e que o quarto nível é capaz de determinar a transformação das outras dimensões de forma mais significativa, ou seja, se a narrativa, o mito, a metáfora, que podemos chamar de cosmovisão que temos sobre o mundo, se modificar, os outros níveis sofrem uma mudança de paradigma e se aprimoram não apenas quantitativamente, mas alteram o foco de sua análise. O modo como enxergamos o mundo, de forma mais profunda, emocional, muitas vezes, inconsciente, poderá redefinir o modo como abordamos um problema.

Podemos considerar o Neo-humanismo como esta visão de mundo, e é o que observamos como pano de fundo em pensadores universalistas, sejam eles ateus ou espiritualistas.

Vamos pensar em um exemplo.

Os indicadores sociais são característicos da dimensão da litania, e quais são utilizados hoje em dia para se pensar em políticas públicas para populações pobres? Índices de pobreza extrema e relativa, multidimensional, de violência, Produto Interno Bruto, entre outros.

Um grande educador brasileiro, Tião Rocha, fundou o Centro Popular de Cultura e Desenvolvimento – CPCD, uma referência de educação comunitária e histórias de êxito na construção de alternativas de educação e formas de atuação social. Sua premissa básica, expressa da forma mais simples, é a de que é preciso uma comunidade para educar uma criança, ou um adulto, ou mesmo uma cidade, ou seja, cada potencial local de aprendizado deve ser utilizado.

Mas para pensar ações e, de forma ampliada, políticas sociais desse tipo, é preciso investigar potenciais, não debilidades, é preciso ver o lado cheio do copo, como ele diz, e isso aponta para indicadores que meçam potências, não ausências.

Outro indicador que vem ganhando destaque é o FIB – Felicidade Interna Bruta, que avalia aspectos sociais, ambientais e econômicos das comunidades e considera uma população feliz, ou não, a partir de nove pilares. A ideia surgiu em 1972 no Butão.

 “Gente infeliz não projeta nada de novo. E, embora a felicidade seja um sentimento individual, pode ser produzida coletivamente. Mas sem indicadores é difícil perceber o quanto é complexa a realidade”, destacou. “PIB mede tudo, menos aquilo que faz a vida valer a pena.” – disse o representante do Butão, Karma Dasho Ura, em debate na Rio+20

Medindo felicidade, você conhece o que trás felicidade, e irá atuar diretamente sobre esses fatores.

Não é possível utilizar indicadores de deficiências para enfrentar problemas como pobreza, por que o potencial de abordagem desses mesmos problemas está justamente ali, onde se vê apenas pobreza. As comunidades mais pobres tem sido um exemplo de resiliência social, tecnologia de baixo custo, cooperação, organização civil, criatividade, e tudo sem o menor apoio dos governos. O aprendizado exige uma olhar equânime, uma troca verdadeira, e uma profunda honestidade sobre aquilo que não sabemos. Não se podem resolver problemas de comunidades que não conhecemos, não podemos sustentar soluções e tecnologias em locais que não permaneceremos.

É preciso começar com o conhecemos, unir aqueles que compartilham do mesmo desejo, de melhorar significativamente as condições da vida neste planeta, e a partir dai, viver a mudança que almejamos, diariamente.

Este aspecto fundamental de desenvolvimento descentralizado está na base da teoria socioeconômica de Prout e é determinante na forma como torna a prática da transformação social acessível a todos.

São princípios ao mesmo tempo universais e adaptáveis por usa própria natureza: autossuficiência local como meta, modo de organização de produção e consumo através de cooperativas, ou seja, da união de interesses comuns, e a nível individual, que é a forma como estamos neste mundo, simplesmente esteja conectado a tudo que o cerca, com pleno envolvimento com a vida, com tudo que constitui a base de nossa sobrevivência e existência plena nesta terra. E neste sentido a espiritualidade, ou o desenvolvimento pleno de nossa potencialidade humana, não parte de nenhuma fuga da realidade, mas de um mergulho profundo nesta humanidade, e além dela, em tudo que constitui a vida.  Ninguém é inapto para realizar esse mergulho, ao contrário, cada um é o mais apto para transformar a realidade de sua localidade. 

Maheshvara PachecoAgir localmente pensar globalmente
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A “Grande Reconfiguração” do Capitalismo, pelos capitalistas

Francisco Dinis

Em Davos, na Suíça, o início de cada ano reúne a elite económica, no Fórum Económico Mundial (FEM) (World Economic Forum, em inglês), cuja a missão é “melhorar o estado do mundo, envolvendo líderes empresariais, políticos, académicos e outros líderes da sociedade para moldar as agendas globais, regionais e industriais”.

            Em Abril de 2020, o FEM publicou um artigo (1) onde defende que a pandemia COVID-19 está ligada à destruição da natureza. O número de doenças emergentes está a aumentar,  relacionando o fenómeno com a desflorestação e a perda de espécies. No artigo, existem vários exemplos de degradação dos sistemas ecológicos causada pelo homem. Também é dito que metade do PIB global é moderadamente ou amplamente dependente da natureza. O artigo conclui que a recuperação da pandemia tem de estar ligada à recuperação da natureza.

            Em Junho passado Klaus Schwab (fundador e responsável do FEM) apresentou o tema para o Fórum deste ano: “The Great Reset”, que decorre de 25 a 29 de Janeiro, com vários temas: “How to save the planet”; “Fair Economies”; “Tech for Good”; “Society and Future Work”; “Better Business”; “Healthy Futures and Beyond Geopolitics” (2)

            Sobre a questão ambiental o Fórum propõe um plano para uma recuperação verde, incluindo um reforço da economia circular. Dentre dos métodos mencionados, destacam-se a construção ecológica, transporte sustentável, agricultura biológica, energias renováveis e veículos elétricos. Estas propostas estão incluídas no denominado capitalismo verde, procurando-se uma redução do impacto ambiental nos processos de produção, uso da reciclagem, eficiência energética e tecnológica.

            Desde há muito tempo sabemos que, se toda a população mundial consumisse a mesma quantidade de recursos que os países mais ricos consomem, tínhamos que ter mais planetas disponíveis do que aquele onde vivemos. Cada vez mais pessoas vão ganhando consciência do que significa isto no mundo real, nos nossos estilos de vida, na destruição do mundo natural e da ameaça real à permanência da civilização humana na Terra. Assim, existe uma contradição na terminologia “capitalismo verde”, pois o objectivo principal do capitalismo é a acumulação de capital, para tal é necessário um crescimento económico constante, e este crescimento será sempre ambientalmente destrutivo, por mais verde que seja, pois a longo prazo a natureza tem limites. Poderemos até ser mais eficientes a usar os recursos naturais, mas continuaremos a destruir. Levaremos mais tempo, mas chegaremos ao seu esgotamento.

             Outro aspecto do Fórum deste ano é a defesa de uma cooperação entre os”stakeholders” da economia, para gerirem as consequências desta pandemia, através de um redesenho do sistema socio-económico capitalista. Isso mesmo, os multimilionários defendem que a estrutura actual deve ser modificada, porque para além da destruição ambiental, a desigualdade económica sistémica ameaça colapsar todo o edifício. Nesse sentido, o FEM está a repescar o conceito de “stakeholder capitalism” e tentar aplicar-lo no momento pós pandemia, ao invés do actual modelo de “shareholder capitalism” (proprietários do capital).

            Qual a diferença entre os dois conceitos? O actual modelo baseado no “Shareholder capitalism” dá primazia a um objectivo único – o de canalizar o máximo possível de dinheiro para os proprietários da empresa (os “shareholders”). Os proponentes do ”stakeholder capitalism” defendem que para além dos proprietários, a empresa deve ter em consideração os trabalhadores, fornecedores, clientes, pois de outra forma as corporações aumentarão sempre a desigualdade económica dentro da sociedade, nessa ânsia de maximização da acumulação destinada aos “shareholders”. Ver debate em (4 e 5).

            Existe um conjunto de reações a estas propostas. Alguns podem dizer que são apenas cosmética, que daqui a alguns anos volta tudo à mesma, com algum marketing a evidenciar algo de positivo feito no entretanto. Os observadores mais à direita dizem que é uma forma de introduzir ideias socialistas e de esquerda, perigosas para o capitalismo. Os fãs (ou fanáticos) da liberdade individual acima de tudo, sentem-se incomodados também, pois uma série de restrições à sua vontade serão impostas por instituições que, afirmam, querem controlar a nossa sociedade global (claro não falando de teorias da conspiração sobre o “Great Reset”, que vão povoando o espaço cibernético, quais histórias mitológicas modernas, onde a racionalidade e a prova factual está ausente).

            Do ponto de vista de Prout o sistema capitalista não conseguirá garantir uma permanente distribuição de riqueza na sociedade, nem uma proteção ambiental adequada, pois na ausência de democracia económica nunca poderá haver um escrutínio e transparência das decisões que impactam todos os intervenientes no sistema, nem haverá um poder  económico descentralizado efectivo (pois muitos continuarão não ter voz), para atingir soluções que atendam às necessidades de todos os seres humanos e não só. Pois uma coisa é termos uma democracia formal, no papel, para sentirmos bem, outra é uma democracia real, vivida e sentida.

            O Great Reset do FEM é uma tentativa de reformar o sistema capitalista. Por um lado o capitalismo verde promete melhorar o ambiente, num processo de transição para um mundo mais ecológico, e o “stakeholder capitalism”, diminuir a desigualdade económica. No fundo temos um grupo de pessoas que actualmente detêm o poder económico, com capacidade de tomar grandes decisões económicas e/ou influenciar políticas públicas, decidir ter um pouco menos de rendimento/riqueza, para evitar um colapso total.

            Antes da implosão do sistema comunista houve também uma tentativa de reforma, a chamada Perestroika do então presidente da USRR, Gorbatchev. Passado alguns anos todo o sistema soviético ruiu literalmente, com a queda do muro de Berlin, “numa bela noite”. O que vai acontecer ao sistema capitalista actual? A ver veremos…

(1) https://www.weforum.org/agenda/2020/04/covid-19-nature-deforestation-recovery/

(2) https://www.weforum.org/events/the-davos-agenda-2021

(3) https://www.rs21.org.uk/2019/03/16/revolutionary-reflections-green-capitalism-a-critical-review-of-the-literature-part-iii/

(4) https://qz.com/1909715/the-difference-between-stakeholder-and-shareholder-capitalism/

(45 https://www.weforum.org/agenda/2020/01/shift-to-stakeholder-capitalism-is-up-to-us/

Maheshvara PachecoA “Grande Reconfiguração” do Capitalismo, pelos capitalistas
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Democracia Económica – Economia para todos….

É espantoso como nos mobilizamos facilmente enquanto sociedade quando sentimos que o sistema político democrático está em perigo. mas muitas vezes assistimos passivos à ditadura ou nepotismo no local de trabalho.

Qual a relação entre sistema político e a economia? O que é a democracia política? E a Económica?

Por de trás de qualquer sociedade existe uma ideologia (conjunto de ideias) dominante que racionaliza as questões inerentes à vida colectiva, servindo de base para os seus valores, ao longo dos séculos. Das ideologias e dos valores surgem as leis que regulam as diferentes interacções entre indivíduos e instituições. Aqui entramos na esfera da política, que interpreta a ideologia e os valores dominantes, para estruturar a sociedade e alcançar objetivos.

Apesar da experiência histórica de Atenas, onde se desenvolveu, ainda que limitado a alguns, um sistema democrático, a maioria destes sistemas políticos foram desenvolvidos nos séculos XIX e XX. Democracia significa que o poder de decisão está nas mãos das pessoas, ou melhor nos cidadãos. Muitos sistemas democráticos surgiram em resposta ao nepotismo político da aristocracia e das instituições religiosas protegidas pelo Estado. No entanto, mesmo nessa altura, a categoria de cidadãos não era estendida a todos os seres humanos, como por exemplo nas sociedades esclavagistas, onde os escravos não tinham qualquer tipo de poder político ou económico. Deste modo, só os proprietários (geralmente homens) poderiam escolher os representantes.

Ao longo do tempo, devido ao activismo social e a pressões históricas (como a I Guerra Mundial), o direito de voto foi alargado aos trabalhadores e ao mundo feminino. Apesar de na teoria ser um sistema pensado para retirar poder político a uma pessoa ou a um grupo limitado, e reflectir o desejo de todos, na prática nos nosso dias quem tem mais poder económico acaba por influenciar todo o sistema. E é aqui que reside o calcanhar de Aquiles da democracia como direito universal; se uma sociedade não é educada, com conhecimentos validados pela ciẽncia e valores humanistas, ou melhor neo humanistas, como poderá fazer escolhas sensatas? Nestas condições a maioria do eleitorado não tem uma abordagem racional em relação aos assuntos a decidir e é facilmente manipulado para premiar com o poder alguns partidos ou pessoas que não estão interessadas no bem coletivo, mas de pequenos interesses de grupos. Estes são os dilemas que nos apresentam a ascensão ao poder do partido nazi na Alemanha e os partidos políticos populistas de hoje em dia, que sabem usar argumentos emocionais, demagógicos e com recurso à não verdade para atingir os seus objectivos de poder.

Ver video sobre a estrutura da Democracia em Atenas.

e ao longo da história

Na esfera económica o sistema capitalista evoluiu e, com os avanços técnicos da revolução industrial, foi possível criar mais bens e aumentar a riqueza das sociedades. No entanto, este desenvolvimento económico foi liderado pelos detentores de capital, guiados pela  directiva da maximização dos lucros num espaço curto de tempo e consequente acumulação de capital nas suas mãos, criando desigualdade na distribuição da riqueza. Aos poucos, os políticos e a política deixaram de ser influenciados pelos aristocratas, para serem pelos industriais e outros agentes de negócios. Com o passar do tempo todos os elementos da sociedade são “obrigados” a vender o seu trabalho para sobreviver, subordinados aos interesses dos que têm poder de empregar. São estes que acabam por tomar as decisões económicas; o que produzir, que quantidades, quem faz o trabalho, quando investir, etc. Tendem a influenciar as decisões políticas, para benefício da sua classe em geral ou mesmo de grupos muito pequenos, para perpetuar o seu poder económico, usando o Estado e a Lei para os seus interesses, à custa do resto da sociedade.

A separação entre poder político e económico deve ser uma realidade, os decisores públicos devem ser eleitos com base nos seus méritos pessoais, conhecimento e carácter.

Deixo aqui um video de Noam Chomsky sobre Democracia e Capitalismo, compatibilidades e incompatibilidades… 

Este centralismo do poder das decisões económicas nas empresas privadas, com as suas consequências negativas na economia, na política e na sociedade em geral, impulsionou desde sempre movimentos populares com outras soluções para a produção de bens e de riqueza e a sua distribuição. Um dos conceitos a explorar é o de Democracia Económica, onde a relação de poder na esfera económica é estruturalmente alterada. Quem trabalha passa também a ter voz nas decisões, ao ser também proprietário. Uma pessoa, um voto é máxima deste tipo de empresas, independentemente do capital investido. Assim o conceito de democracia, onde todos podem emitir opinião sobre os assuntos a decidir, é aplicado na esfera económica. O sentimento de pertença e comunidade de todos é aumentado, a corresponsabilização pelo sucesso económico está na mente de todos, preocupações ambientais e da comunidade são consideradas.

Muitos mitos, receios, pressupostos e ideias não questionadas, impedem-nos de visualizar, pensar e materializar este conceito a uma escala maior. Pensamento estruturado e projectos implementados em torno da ideia de Democracia na esfera económica, são desde já ferramentas disponíveis para essa mudança. Com o desgaste do sistema Capitalista, com as crises económicas cíclicas que trazem pobreza e desemprego, com o recurso ao dinheiro do Estado (proveniente de impostos e de dívida pública) para manter o status quo económico das grandes empresas e bancos, um sentimento descontentamento leva a que a maioria das pessoas possam estar abertas a mudanças.

Estratégias e politicas para as mudanças necessárias já estão pensadas e testadas em escalas pequenas, ver link

Vídeo “We the Owners”,  com alguns exemplos práticos da aplicação do conceito de Democracia Económica

Outro vídeo foca os benefícios, a nível pessoal, de trabalhar em espaços económicos democráticos

Um novo contrato social é necessário, alargando os direitos dos cidadãos para que tenham uma economia saudável e democrática. Se esta for a força mobilizadora da sociedade e das políticas, um conjunto de recursos e know-how podem ser mobilizados para estes objectivos. A separação entre poder político e económico,  passando o controlo das economias para as comunidades a nível local, de forma a que um planeamento racional pode garantir o desenvolvimento económico pensado para beneficiar a todos os habitantes de cada região.

Francisco Dinis

Maheshvara PachecoDemocracia Económica – Economia para todos….
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